Ibovespa dispara 33% em 2025 e deve registrar maior alta em nove anos, apesar dos juros elevados

Guia Modelo Escrito em 30/12/2025


O Ibovespa disparou em 2025, e encerrará o ano com alta superior a 30%. Se permanecer acima dos 32% ao final do pregão desta terça-feira (30), o principal índice da bolsa brasileira terá o maior avanço anual desde 2016, quando registrou valorização de 38,9%, segundo levantamento da consultoria Elos Ayta. O desempenho positivo responde a uma série de fatores, mesmo em um cenário de juros elevados no país, em que a Selic encerra 2025 em 15% ao ano — maior patamar em 20 anos. 📱Baixe o app do g1 para ver notícias em tempo real e de graça Segundo dados da B3, o Ibovespa acumulou 32 recordes de fechamento ao longo deste ano. É o maior número desde 2019, quando atingiu 40 recordes, em um período de valorização do mercado. Segundo especialistas ouvidos pelo g1, o bom desempenho da bolsa brasileira no ano se deve, principalmente, aos seguintes fatores: Cortes de juros nos Estados Unidos, com expectativa de novas reduções no ano que vem; Realocação de investimentos em meio a incertezas sobre as contas públicas e a política econômica de Donald Trump nos EUA, o que favoreceu ativos brasileiros; Expectativa de cortes de juros no Brasil, com o mercado já olhando para 2026; Maior resiliência do Brasil nas tensões comerciais com os EUA, reduzindo impactos sobre empresas exportadoras; Ações de empresas brasileiras ainda negociadas abaixo dos níveis pré-pandemia, o que atraiu investidores; Expectativa de mudanças no cenário político, em especial na condução das contas públicas, com a proximidade das eleições de 2026. Veja abaixo, ponto a ponto, os principais aspectos que influenciaram o desempenho do Ibovespa em 2025. O peso de fatores externos O cenário internacional teve influência decisiva sobre a alta do Ibovespa neste ano, segundo analistas do mercado financeiro. Um dos principais vetores foi a mudança de postura do Federal Reserve (Fed), o banco central dos EUA. O Fed cortou os juros americanos três vezes em 2025, reduzindo a taxa da faixa de 4,25% a 4,50% ao ano para 3,50% a 3,75% ao ano — o menor patamar desde setembro de 2022. A expectativa também é de redução em 2026. 🔎 Na prática, juros menores nos EUA diminuem o rendimento das Treasuries, os títulos do governo americano, que são vistos como os investimentos mais seguros do mundo. O movimento faz investidores buscarem aplicações mais rentáveis em mercados emergentes. Nesse cenário, o Brasil tem se destacado, favorecendo a bolsa e o real. Lauro Sawamura Kubo, gestor de fundos de investimento da Patagônia Capital, ressalta também que cresceu o receio em relação às contas públicas dos EUA. Neste ano, ocorreu a paralisação do governo (shutdown) mais longa da história, o que piorou as incertezas de investidores com os rumos do país. “Com esse conjunto de fatores, perde força a ideia de os EUA serem uma reserva de valor, e investidores passam a buscar alternativas”, analisa, citando o Brasil como destino importante. A esse cenário se somam a pressão e as tentativas de interferência de Donald Trump no BC americano — o que deixou os mercados mais tensos — e a política comercial do republicano, marcada pelo tarifaço, que também levou investidores globais a reorganizar seus portfólios. “Não se trata de uma perda de protagonismo dos EUA, mas de uma redistribuição. A alocação em Treasuries estava muito acima do nível neutro, e isso beneficia mercados como o brasileiro”, diz Harrison Gonçalves, CFA Charterholder e membro do CFA Society Brazil. Ações brasileiras vistas como 'pechincha' Na avaliação de analistas ouvidos pelo g1, empresas brasileiras sólidas estavam sendo negociadas a valores baixos — ou seja, com ações aquém de seu potencial. "A bolsa brasileira ainda não havia retomado, de forma consistente, os níveis anteriores à pandemia, enquanto outros mercados já tinham avançado mais”, aponta Marcos Praça, diretor de análise da ZERO Markets Brasil. Segundo ele, o “pessimismo mal dimensionado” ficou para trás, e grandes empresas brasileiras se mostraram sólidas, atraindo investidores que passaram a enxergar suas ações como “pechinchas”. 🔎 A bolsa brasileira passou a ser vista como relativamente barata e com maior potencial de retorno. Com investimentos no exterior oferecendo ganhos menores, investidores anteciparam compras de ações brasileiras apostando em uma recuperação. Outro fator determinante foi a capacidade de adaptação do mercado brasileiro diante das tensões comerciais provocadas pelo tarifaço de Trump, mesmo depois da elevação das taxas para 50% com uma longa lista de exceções. "Mesmo com esse cenário ruim, o país mostrou resiliência, remanejou as exportações, apresentou números ainda maiores e ainda anulou as tarifas", afirma Marcos Praça, acrescentando que o movimento ajudou a manter o Ibovespa no campo positivo. Mais tarde, em novembro, mais 200 produtos alimentícios — incluindo café, carne, açaí e manga — também foram retirados da sobretaxa. Mesmo com a melhora de cenário, o governo brasileiro ainda trabalha para derrubar todas as tarifas a produtos brasileiros. B3, bolsa de valores brasileira. Divulgação/ B3 Crescimento apesar dos juros altos A taxa básica de juros brasileira está no maior patamar em quase 20 anos — o que tende a atrair investidores para aplicações de renda fixa. Ainda assim, as expectativas para 2026 contribuíram para impulsionar o Ibovespa. Felipe Tavares, economista-chefe da BGC Liquidez, explica que diversos aspectos estão interligados e que a perspectiva de corte de juros é um elemento importante para a atração de capitais para a bolsa. Até o fim de 2026, o mercado financeiro projeta uma redução da Selic para 12,25% ao ano. “Eu destacaria o corte dos juros americanos, a manutenção da Selic em 15%, o fluxo de capitais resultante e a bolsa com preços atrativos, o que cria oportunidades”, afirma. O mercado financeiro é, por natureza, voltado à antecipação de cenários, acrescenta Harrison Gonçalves, do CFA Society Brazil. Assim, o principal foco está na alocação de capital com base na valorização futura esperada dos ativos. "O fato de a bolsa se valorizar mesmo em um ambiente de juros ainda elevados indica que o mercado está olhando para o médio e longo prazo — algo em torno dos próximos cinco anos — e não apenas para as condições atuais", diz. Contas públicas em segundo plano? A preocupação com os cofres públicos do Brasil ganhou destaque ao longo dos últimos anos. O tema, entretanto, ficou temporariamente "na gaveta", enquanto o mercado acompanha com otimismo a redução dos juros americanos e os preços baixos das ações brasileiras. Isso, porém, não significa que o tema tenha sido completamente esquecido. Para os analistas, o problema fiscal ainda limita o pleno crescimento da economia brasileira e deve voltar a ganhar peso no debate. "Os temores fiscais ficaram em segundo plano por fatores temporários. O risco continua muito elevado. Ninguém acredita que houve melhora nesse aspecto", diz Lauro Sawamura Kubo, da Patagônia Capital. "No próximo ano, teremos um período eleitoral e, historicamente, independentemente de quem esteja no governo — seja à direita ou à esquerda — esse é um momento marcado por mais gastos e medidas populistas. Portanto, é provável que isso volte a ocorrer", acrescenta. Além disso, a desconfiança com as contas públicas tem pressionado o Banco Central a manter os juros brasileiros elevados, mesmo com a inflação caminhando para encerrar 2025 dentro do teto da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), apontam os especialistas. 200 mil pontos? O que esperar para 2026 com eleições A volatilidade registrada no Ibovespa no início de dezembro indica como o índice pode se comportar ao longo de 2026, ano eleitoral. O anúncio da pré-candidatura do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), por exemplo, fez o dólar disparar e a bolsa recuar mais de 4% em apenas um dia. Analistas avaliam que a entrada do filho de Jair Bolsonaro (PL) na corrida eleitoral fragmenta a oposição e reforça as chances de reeleição de Lula (PT). 🔎 Para o mercado, a escolha dificulta a convergência em torno de um candidato de centro-direita — como Tarcísio de Freitas, visto como mais competitivo para unificar a direita e enfrentar Lula — e amplia a incerteza sobre ajustes fiscais mais consistentes. Para Felipe Tavares, da BGC Liquidez, esse é justamente um termômetro do que pode ocorrer no ano que vem. “A polarização traz volatilidade adicional ao mercado, o que gera mais tensão no dia a dia”, diz. “Apesar da tensão gerada pelo cenário político interno, a volatilidade externa tende a ser menor em 2026, o que pode suavizar parte do impacto sobre o mercado”, pondera. Para o economista, a possível combinação de cortes na taxa Selic e de alternância no ciclo político pode levar a bolsa a atingir os 200 mil pontos no próximo ano. Ele avalia, no entanto, que cenários adversos podem frustrar essa perspectiva positiva. Marcos Praça, da ZERO Markets Brasil, destaca que diversos fatores complexos devem orientar o fluxo de recursos em 2026. “É difícil atribuir uma pontuação precisa ao Ibovespa ao fim do ano, mas eu diria algo entre 170 mil e 200 mil pontos”, diz. Einar Rivero, da consultoria Elos Ayta, lembra que, com base no histórico, o índice reflete uma sucessão de ciclos econômicos e políticos, mais do que uma trajetória contínua, em que "períodos de forte valorização frequentemente sucedem anos de ajustes profundos, e vice-versa". “A leitura dos últimos 26 anos mostra que o comportamento do índice está diretamente associado à combinação entre cenário macroeconômico, ambiente político e percepção de risco, fatores que moldam, ano a ano, o humor do mercado brasileiro”, conclui.